ESTÁTICA E MOVIMENTO

23 de setembro de 2008

MANDA QUEM PODE...

E quem pode… PAGA! Paga para que os resultados apareçam!

Há muito tempo que manifesto a minha opinião sobre o método de acesso ao ensino superior: é mau, cria desigualdades, para além de ser o principal responsável pelos principais problemas no ensino secundário em Portugal (e por arrastamento do ensino básico).

Muitos Pais estão de acordo com a minha opinião. No entanto não se manifestam. Provavelmente terão receio de algum poder oculto que ainda por aí deambule ou antevejam a possibilidade de poderem, eles ou os seus filhos, vir a retirar algum dividendo do actual método de acesso. Lembro que num sistema que cria desigualdades há sempre quem seja beneficiado e quem seja prejudicado.

Para falar de acesso ao ensino superior temos de falar de muitos outros assuntos relacionados. Ensino público e privado, condições das instalações das respectivas escolas, exames nacionais, explicações e aulas de recuperação…

Na verdade facilmente se constata que os colégios particulares, explicações e qualquer outro expediente que “ajude” ou mesmo “impulsione” as notas dos seus filhos, estão na moda! Claro que vivemos num País democrático e livre, com uma economia liberal e onde a livre iniciativa e o empreendedorismo deve ser incentivado! E estes conceitos até podem ser verdadeiros e usados como argumentos! Mas não podemos aceitar que sirvam de camuflagem para formas de proceder que, apesar de legais, prejudicam cidadãos com enorme potencial e que merecem maior igualdade de tratamento na forma como é feito o acesso ao ensino superior!

Curioso é o que acontece em cada novo ano lectivo. É possível prever cada um dos episódios que irá acontecer…

Se existe possibilidade económica, os Pais colocam os filhos num colégio privado! Muitos apresentam condições deficitárias no que respeita a instalações e demais condições para os alunos. Mas, os Pais preferem! Segundo estes haverá mais exigência e mais disciplina! Tal não será verdade em todos, mas…

No final de cada período as habituais reuniões… que nas escolas publicas servem para informar os Pais e Encarregados de Educação das notas dos filhos e dos problemas que a escola pública atravessa! Nas escolas privadas servem para os Pais informarem quais são as expectativas que têm para os filhos e os objectivos (leia-se notas) que estes devem atingir!

No final do segundo período os resultados são avaliados pelos Pais e, caso esses resultados não satisfaçam, equaciona-se a mudança para algum colégio ou externato que aceite os alunos. Caso não seja possível a transferência “corre-se” atrás de explicações ou aulas de preparação para exames…

Seja nas escolas públicas ou privadas, nos meses que antecedem os exames, uns preferem destacar o stress de quem faz exames e a justiça, ou injustiça, de um exame realizado num tempo limitado. Outros preferem salientar a necessidade de avaliar os alunos através da exigência de um exame e a necessidade de “equilibrar” as notas a nível nacional com a realização de um exame para todos!

Passado o frenesim dos exames, passa-se para a fase seguinte: concurso ao ensino superior! No instante em que as notas dos exames são divulgadas, inicia-se o discurso sobre o acesso ao ensino superior, vagas, números de alunos a colocar, saídas profissionais...e muitos sentem também a angústia e a incerteza quanto à possibilidade de “entrar” em determinada faculdade, face às notas obtidas em exames. Algumas (muitas) famílias começam a fazer contas (muitas) à vida de forma a (re)equilibrar o orçamento familiar face à chegada de novas despesas que poderão ser “apenas” a propina numa faculdade pública – ou numa privada se não for conseguida a colocação no ensino público, deslocações, alimentação, alojamento para muitos alunos, livros e todo o material escolar que não deixa de ser necessário por se estar na faculdade…

Do governo ouve-se números… Só números! Mais de 40.000 mil que entraram na primeira fase! Zero vagas em muitas faculdades para a segunda fase! Percentagem alta de alunos que entraram na primeira opção!

Propaganda…

Para não parecer propaganda deveriam divulgar a quantidade de alunos que efectivamente se manteve no curso em que foi colocado sem uma única vez ter feito uma tentativa para se colocar no que pretendia! Ou melhor ainda, se tal fosse possível: dizerem quantos ficam satisfeitos com a sua colocação!

Com números também se fala nas dificuldades financeiras que as universidades atravessam! Como que a dizer às famílias que podem acontecer aumentos “necessários” nas propinas que permitam “equilibrar” os gastos!

Nada se fala sobre o método que coloca os alunos nessas faculdades!

É como se o sistema fosse perfeito, justo e adequado às realidades do País e, acima de tudo, premiasse o mérito, os conhecimentos ou as capacidades de quem estuda com um lugar na faculdade.

Na verdade assim não é.

Este método permite a manipulação de demasiados factores potenciadores de desigualdades. E parece que ninguém repara nisso! E perante as últimas reformas no Ensino Secundário, até parece que alguém está apostado em aumentar os factores de desigualdade...

Mas de que factores falo? Nível económico dos pais e encarregados de educação e região residência (distrito, cidade, concelho ou mesmo freguesia).

Para Pais e Encarregados de Educação estes factores, em conjunto com a sua perspectiva da educação e algum conhecimento sobre o método de acesso ao ensino superior, permitem autênticos milagres no acesso ao ensino superior!

Quem pode… Manda! E quem manda coloca os filhos nas escolas que garantam os melhores resultados! É quase como investir na bolsa, mas com maior certeza no retorno do investimento!

Dirão alguns que o que acabei de dizer são tretas. Não se pode manifestar esta opinião. E outras coisas mais…

Respondo a estas formas de argumentar com uma pergunta: porque não são feitos estudos que relacionem as colocações dos alunos nas faculdades com alguns dados como:
- Notas obtidas no secundário;
- Notas obtidas nos exames nacionais;
- Escolas que os alunos frequentaram no ensino básico e secundário;
- Zonas de residência dos alunos;
- Zonas de origem das famílias (concelhos e freguesias);
- Nível económico dos pais e/ou dos encarregados de educação;
- Valores estimados que as famílias gastaram no percurso do aluno no ensino secundário;
- Quantidade de alunos com apoio dos serviços de acção social;

Seria curioso também ver estudos sobre taxas de retenção em cada uma das faculdades nos diferentes anos... Aqui seria interessante saber quanto gasta o País com estes alunos. Seria também muito interessante associar o nível económico dos Pais a estas situações de retenção!

Se existem estudos deste tipo, provavelmente não foram determinantes para suscitar o debate sobre o acesso ao ensino superior e sobre o próprio ensino superior.

Por outro lado estranho que no meio das muitas reformas em implementação no ensino em Portugal, a única com relevo e que diz respeito ao ensino superior, refere-se à área económico-financeira, o que pode dar ideia que tudo vai bem menos os fundos que as Universidades possuem para se manterem em funcionamento! Sobre outros assuntos nem interessa falar!

E todo este silêncio interessa a quem? Às classes mais favorecidas economicamente? Aos detentores de cargos políticos ou públicos? Aos empresários? A todos eles? Ou a nenhum deles?

Penso que a todos eles… E a mais alguns que, por obra do acaso ou da sorte se vão intrometendo no meio dos que conseguem acesso ao curso que colocaram na tal primeira opção!

Soluções?

Sem pretender apresentar soluções finais, proponho ideias que poderiam ser o princípio a seguir no caminho da modificação do acesso ao ensino superior. Assim seria de implementar:
- Separação completa e definitiva entre as notas obtidas no ensino secundário e as notas que servem para acesso às universidade;
- Acabar com os exames nacionais no ensino secundário, valorizando a escola e os métodos pedagógicos que esta usa para justificar as notas que os alunos obtêm;
- As notas para aceso ao ensino superior serão obtidas através da realização de exames nacionais, dois por faculdade, a definir por estas e cada um deles com um peso de 50% para a nota de entrada;
- Possibilidades para os critérios de desempate:
- Realização de entrevistas aos candidatos empatados; ou
- Entrada de todos os alunos que reúnam condições iguais ao último seleccionado.

Evidente que os pais e encarregados de educação com maiores possibilidades económicas poderão continuar a pagar explicações e colégios particulares que preparem os alunos para os exames de acesso… Mas esse factor interfere menos nos restantes alunos, já que o mérito e a vontade de estudar não se pagam com dinheiro algum. E vontade de estudar nem todos terão da mesma forma…!

É evidente que tudo o que existe ou vais existindo em Portugal é reflexo do sistema político vigente. Mas era necessário mudar…

Paulo Gomes da Costa
2008.09.22

Etiquetas: ,